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    Congresso internacional traz avanços no combate ao câncer

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    Depois de dois anos no formato virtual, o congresso da Associação Norte-Americana de Oncologia Clínica, o Asco, voltou a reunir mais de 40 mil pessoas em Chicago, trazendo importantes novidades para o tratamento de câncer. Segundo especialistas, o evento, encerrado no último dia 7, atendeu às expectativas e mostrou que, apesar da pandemia de covid-19, foi possível avançar nos estudos sobre novas estratégias de tratamento. Também mereceu destaque o debate sobre a desigualdade no acesso aos medicamentos, o que se agravou durante a crise sanitária mundial.

    De tumores raros aos mais comuns, ao longo de cinco dias, pesquisadores do mundo todo apresentaram, literalmente, milhares de resultados de estudos, incluindo as sessões de pôsteres. Na avaliação de médicos que participaram do evento, as pesquisas que mais repercutiram na comunidade científica foram relacionadas a câncer colorretal e de mama. Alguns dos artigos sobre essas doenças mostraram importantes ganhos na sobrevida dos pacientes.

    Para o oncologista Cristiano Resende, do Grupo Oncoclínicas, a “menina dos olhos” do congresso foi a fase 3 do estudo Destiny, com pacientes de câncer de mama metastático. “O estudo foi apresentado na Plenária, com 100% dos médicos assistindo. Foi ovacionado, o público ficou de pé por um minuto e meio, aplaudindo”, relata o médico, que também levou um trabalho ao congresso (Leia mais nesta página). O motivo da comoção foi o aumento significativo da sobrevida livre de doença (quando o câncer está em remissão) e da sobrevida global de pessoas que, até então, não tinham a opção de serem tratadas com uma droga que já se mostrou muito eficaz no tratamento de tumores mamários.

    Estima-se que metade das pacientes de câncer de mama possam ser beneficiadas com a descoberta. São pessoas que têm a forma metastática da doença, mas que apresentam baixa expressão de um receptor nas células cancerosas que é alvo do medicamento trastuzumab deruxtecan, uma combinação de anticorpo monoclonal com quimioterápico. “Há alguns anos, esse remédio mudou a prática clínica”, observa Resende.

    Porém, a substância destina-se apenas às mulheres que têm uma grande quantidade do receptor HER2 nas células doentes. Aquelas cujos testes mostram uma expressão negativa ou duvidosa — classificadas agora de HER2-low (low de baixo, em inglês) não tinham indicação para esse tratamento. Agora, contudo, pesquisadores mostraram que essa população também pode ser tratada com o trastuzumab deruxtecan e ter um ganho significativo. O estudo do Memorial Sloan Kettering Cancer Center, em Nova York, incluiu 557 voluntárias com o perfil HER2-low. Dessas, 373 receberam o medicamento, e as restantes foram tratadas com a quimioterapia padrão.

    Segundo os pesquisadores, comparadas ao segundo grupo, nas mulheres que receberam o trastuzumab deruxtecan, o risco de a doença crescer e se espalhar foi 49% menor. A mortalidade durante o acompanhamento — 18,4 meses — foi 36% menor. “Nosso estudo mostra que a substância pode ser uma nova e altamente efetiva opção de terapia alvo disponível para a nova classificação das pacientes”, disse, em um comunicado de imprensa, Shanu Modi, principal autor do estudo.

    O medicamento foi aprovado no Brasil neste ano para as pacientes com HER2 positivo. O laboratório já entrou com pedido de inclusão daquelas com perfil HER2-low na Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa). Porém, sendo um remédio novo e muito caro — o tratamento de uma pessoa chega a US$ 50 mil —, ele não é ofertado pelo Sistema Único de Saúde (SUS) e mesmo as usuárias de planos privados podem ter dificuldade de consegui-lo no país.

    100% de remissão

    Um fato inédito na história do congresso foi a apresentação de um estudo que relatou 100% de remissão de um raro tumor retal em estágio avançado. Pessoas com o chamado dMMR têm uma alteração molecular que dificulta a resposta ao tratamento padrão — quimio e radioterapia. Essa anomalia, que acontece no momento em que a célula faz cópias do DNA, está presente em aproximadamente 5% a 10% de todos os tumores de reto, segundo os autores da pesquisa. Tratados por seis meses com o imunoterápico dostarlimab aplicado via venosa a cada três semanas, todos os participantes do estudo se viram livres do câncer retal dMMR, o que foi comprovado em avaliações radiológicas e endoscópicas.

    O número de pacientes envolvidos foi pequeno, 14, mas o suficiente para o trabalho ser reconhecido como um dos mais importantes do congresso. “As respostas nesses primeiros pacientes foram notáveis e excedem o que esperávamos com a quimioterapia padrão mais radiação”, comenta a oncologista gastrointestinal Hanna K. Sanoff, que não participou da pesquisa. Segundo a médica do Hospital do Câncer da Carolina do Norte, nos EUA, como esses tumores retais não respondem bem à quimioterapia e à radiação, muitos pacientes precisam ser operados. “Infelizmente, a cirurgia pode resultar em consequências notáveis para a saúde, incluindo danos nos nervos, infertilidade e disfunção intestinal e sexual.”

    O dostarlimab é uma imunoterapia e deve chegar ao Brasil em agosto, com a indicação para tratamento de câncer de endométrio. No estudo, que, no fim, será feito com 30 pacientes, todos os 14 participantes tinham câncer retal dMMR nos estágios 2 e 3, mais avançados. “Gostaria de destacar que a maioria desses pacientes tinha tumores grandes e volumosos. O padrão de atendimento para eles provavelmente exigiria as três modalidades de tratamento: quimioterapia, radioterapia e cirurgia”, disse, na apresentação do estudo, Andrea Cercek, chefe da seção de câncer colorretal do Memorial Sloan Kettering Cancer Center e um dos autores do artigo, publicado simultaneamente na revista The New England Journal of Medicine. Na publicação, os dados são de 12 pessoas, mas o número subiu posteriormente.

    “Nós já tratamos um total de 14 pacientes, e todos — 100% — tiveram uma resposta clínica completa apenas com dostarlimab. Nenhum paciente necessitou de quimioterapia, radioterapia ou cirurgia. Não houve evolução de grau do tumor. Não foram observadas recorrências da doença”, continuou Cercek, ressaltando que é necessário um acompanhamento mais longo dessas pessoas para estabelecer a durabilidade do tratamento. Por enquanto, elas foram avaliadas ao longo de dois anos.

    Três perguntas para

    Fernando Maluf, oncologista e fundador do Instituto Vencer o Câncer
    crédito: Arquivo Pessoal.

    A pandemia de covid atrapalhou de alguma forma as pesquisas na área oncológica?

    A pandemia atrapalhou a pesquisa e o tratamento de câncer no mundo inteiro, e um dos motivos principais foi o isolamento. O que aconteceu é que o número de pacientes incluídos nos protocolos clínicos caiu drasticamente. Muitos deles acabaram tendo dificuldade de acesso aos centros. No nosso país, houve, em vários locais onde a estrutura de câncer era acoplada a áreas não oncológicas, o direcionamento de leitos para a covid; salas de aplicação de quimioterápicos direcionadas a outras condições; e UTIs lotadas. O que aconteceu foi que, por uma questão estrutural, muitos hospitais tiveram uma redução no atendimento de pacientes de câncer.

    Houve muitas expectativas em relação ao Asco 2022, por ser o primeiro congresso presencial desde 2019. Os trabalhos apresentados corresponderam ao que se esperava?

    Foi muito bom ser presencial porque a gente consegue, outra vez, o que não consegue on-line, que é interagir com colegas e lideranças do mundo inteiro e desenhar projetos de pesquisa trabalhando como um grupo. Os trabalhos corresponderam às expectativas. Houve estudos de câncer de mama importantes, como o Destiny, que mostrou um ganho de sobrevida livre de progressão muito significativo. Outro estudo com 12 pacientes de tumor de reto que tiveram resposta completa só com o imunoterápico, sem precisar de quimio, rádio ou cirurgia. Além disso, houve consolidação importante, como os radiofármacos, o caso de câncer de próstata metastático resistente à castração; o papel da imunoterapia, aumentando a sobrevida de pacientes com câncer de colo de útero; novas drogas imunoterápicas no tratamento do câncer de bexiga superficial; e a introdução de novos agentes nos cânceres de cabeça e pescoço, aumentando a sobrevivência com a radioterapia. São estudos muito importantes porque podem beneficiar pacientes a curto prazo.

    Além de resultados de estudos, o congresso abordou a desigualdade no acesso a medicamentos. Como foi esse debate?

    Isso foi assunto de várias mesas do congresso. Não adianta ter tecnologia se ela não chega às pessoas como um todo. Então, acho que existe até do ponto de vista das agências internacionais uma preocupação maior de como a gente consegue garantir equidade no cuidado do paciente oncológico dentro dos próprios países e também entre os países do mundo inteiro. 

    Aumento dos casos de metástase

    crédito: Arquivo Pessoal.

    A pandemia de covid não fez vítimas somente entre os infectados pelo Sars-CoV-2. Pacientes de câncer foram prejudicados, o que teve como consequência uma redução do diagnóstico em fase inicial, dificultando as chances de cura. Um trabalho brasileiro apresentado na sessão de pôsteres do Congresso da Sociedade Norte-Americana de Oncologia Clínica (Asco) encontrou uma diminuição estatística importante nos atendimentos, ao mesmo tempo em que aumentou o número de pacientes com metástases.

    O estudo foi realizado com base nos dados de quase 12 mil pessoas atendidas pelo grupo Oncoclínicas em todo o país, inclusive em Brasília. Os pesquisadores compararam a quantidade de pacientes de câncer de mama que buscaram as clínicas da rede entre 2018/2019 com as que procuraram ajuda médica entre 2020/2021.

    “Houve uma diminuição no número de pacientes iniciais (que se consultaram pela primeira vez), passando de 68% para 58%. Ao mesmo tempo, aumentou o número de pacientes com doença metastática, de 12% para 19%”, diz o oncologista Cristiano Resende, um dos autores da pesquisa. Ele explica que, embora o estudo não tenha investigado relação de causa e consequência, é muito provável que as estatísticas sejam explicadas pela pandemia, quando muitas pessoas deixaram de sair de casa para fazer os exames de rotina que podem detectar a doença em fase inicial.

    “Fica muito claro que isso está relacionado à falta do exame de rastreamento”, observa Resende. “Estamos falando de uma doença que, quando metastática, é incurável. Houve um aumento de pacientes com metástases de 7%. Exatamente na faixa etária onde havia mais chances de prevenir, que são as mulheres com mais de 50 anos e na pós-menopausa. Esse também é o grupo de maior risco de covid. Então, acreditamos que muitas pessoas deixaram de fazer os exames devido ao isolamento.”

    Fonte: Correio Braziliense.

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    Sara Celestino
    Sara Celestinohttps://gazeta24horasrio.com.br
    Repórter-fotográfica, atuando na produção de conteúdo com objetivo de compartilhar a melhor informação para manter você bem-informado! E-mail. [email protected]

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