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Menina morta durante guerra do tráfico do Rio será enterrada nesta sexta-feira

 Ester de Assis Oliveira, de 9 anos, foi atingida na cabeça e não resistiu. Foto: Reprodução 

Atingida com um tiro na cabeça durante confronto de traficantes rivais no morro do Cajueiro, em Madureira, Ester de Assis Oliveira, de 9 anos, será sepultada nesta sexta-feira. A mãe de Ester de Assis Oliveira, de 9 anos, Thamires Assis passou a manhã de ontem no Instituto Médico Legal (IML) agarrada ao urso de pelúcia da filha. Durante as três horas que esteve no local para liberar o corpo da criança, não soltou o brinquedo e repetia “minha menininha” e “quero ela comigo”.

Ester foi atingida no Morro do Cajueiro, em Madureira, Zona Norte do Rio, um dos bairros mais populosos da cidade, após uma tentativa de invasão de traficantes rivais do Complexo da Serrinha. Durante os confrontos, o entregador de gás João Vitor Pereira Brander, de 19 anos, também foi morto. Outras três pessoas, que não tiveram suas identidades reveladas, foram baleadas.

A menina passou a quarta-feira na escola municipal Astolfo Rezende, participou de um lanche coletivo para comemorar a Páscoa, fez vídeos e posou para fotos ao lado de colegas. Ao sair do colégio para a casa no Morro do Cajueiro, andou pouco mais 450 metros até ser atingida com um tiro na cabeça no momento em que traficantes da Serrinha tentavam invadir a comunidade que Ester morava. As favelas são separadas apenas pela Avenida Edgard Romero, a principal do bairro, onde ficam as estações do BRT e o Mercadão de Madureira.

Após ser atingida, a menina foi levada ao Hospital Getúlio Vargas, na Penha, mas não resistiu. Ela será sepultada hoje no Cemitério do Irajá. Dados da ONG Rio de Paz apontam que ela foi a quarta criança morta por bala perdida esse ano no estado.

João Vitor, a segunda vítima fatal do confronto das facções rivais anteontem, trabalhava com entrega de botijão de gás na comunidade e era morador de Irajá, também na Zona Norte. O rapaz estava no horário de almoço quando foi atingido e morreu no local. Um vídeo mostra ele chegando ao trabalho no dia em que foi morto. Testemunhas ouvidas pelo GLOBO dizem que os traficantes atiraram contra os moradores.

— A gente estava na rua. Os caras da Serrinha chegaram atirando em todo mundo. O João Vitor é um cara que não tenho nem palavras para descrever. Todos estão em choque. Menino honesto, trabalhador, família. Nunca foi traficante. A guerra em Madureira não para. É lamentável, você anda na rua com medo — diz a testemunha.

Guerra pelo controle

Questionada, a Polícia Militar não respondeu se a inteligência da corporação identificou a movimentação dos traficantes para a invasão do Cajueiro. Em nota, a PM apenas disse que intensificou o policiamento na região e atuou para o restabelecimento do trânsito na região após os protestos realizados ontem em várias vias de Madureira. A Delegacia de Homicídios investiga as duas mortes no confronto. Os demais casos serão apurados pela 29ª DP (Madureira).

A disputa pelo controle das favelas da região de Madureira é antiga, mas se intensificou no último ano, segundo relatos de moradores que mais uma vez testemunharam o rastro de violência dessa guerra. Em 2016, no domingo de Páscoa, Ryan Gabriel Pereira dos Santos, de 4 anos, também foi morto ao ser atingido por uma bala perdida enquanto brincava com o avô na calçada, no Morro do Cajueiro. Na ocasião, também houve uma tentativa de invasão de uma quadrilha rival.

O tráfico de drogas na Serrinha é comandado por Wallace de Brito Trindade, conhecido como “Lacoste”, que também domina as favelas Fazenda, Patolinha, São José e Dendezinho. Ele é integrante da facção Terceiro Comando Puro e também teria se aliado a milicianos da região.

Já a Favela do Cajueiro tem um homem conhecido como Graveto no comando, membro do Comando Vermelho, uma facção rival. Ele teria sido indicado por Edgar (Doca), que controla o tráfico no Complexo da Penha, para comandar os negócios do grupo criminoso na comunidade.

Protesto por mortes

Ontem, um protesto pelas mortes fechou diversas ruas de Madureira, próximas a favela do Cajueiro. Alguns manifestantes colocaram fogo em objetos na rua e outros pararam os ônibus que circulavam na região e furtaram as chaves dos veículos. Na Rua Conselheiro Galvão, outra movimentada do bairro, ao menos dez ônibus tiveram as chaves roubadas. Os coletivos ficaram por algumas horas abandonados nas ruas até serem rebocados.

Local do confronto — Foto: Editoria Arte
Local do confronto — Foto: Editoria Arte

Testemunhas relataram ao GLOBO que cerca de dez motociclistas mandaram o motorista da linha 685 (Irajá x Méier) atravessar o veículo na Conselheiro Galvão para bloquear a passagem de outros carros. Depois, um deles entrou no coletivo, puxou a chave e a jogou num bueiro. Para conseguir recuperar a chave, funcionários da empresa de ônibus arrebentaram a tampa do bueiro com a ajuda de um reboque e a “pescaram” com um imã.

Vias inteditadas em protesto — Foto: Editoria Arte

Três ônibus do corredor Transcarioca do BRT, na Avenida Edgard Romero, também tiveram as chaves furtadas. Segundo a Mobi-Rio, que administra o sistema, a janela de um deles foi quebrada pelos passageiros para conseguirem sair. Por quase cinco horas as linhas (Galeão x Manaceia) e (Alvorada x Penha) tiveram a circulação interrompida.

Com as vias fechadas, alguns motoristas usaram a pista exclusiva do BRT para deixar a região. Equipes da PM também ocuparam a calha para dispersar os manifestantes, e utilizaram bombas de efeito moral.

Gerente de um restaurante na Barra da Tijuca, Lucas Cavalcante aguardava a reabertura da estação Otaviano para ir ao trabalho.

—Mandei foto para o meu patrão. Estou desde meio-dia aqui, e vim lá do Marambaia (Irajá) andando. Isso aqui é uma guerra — disse Lucas.

Fonte: Extra.

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