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    Guerra entre tráfico e milícia na Zona Oeste do Rio pode estar por trás de assassinato de médicos; entenda

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    Os médicos fizeram uma selfie pouco antes de serem mortos — Foto: Reprodução

    Três médicos que vieram para o Rio para um congresso de ortopedia foram executados a tiros num quiosque na orla da Barra da Tijuca, na Zona Oeste do Rio. As vítimas haviam acabado de pagar a conta e iam voltar ao hotel onde estavam hospedados — que fica em frente ao local do crime, do outro lado da Avenida Lúcio Costa — quando, por volta de 1h da madrugada de ontem, foram surpreendidos por crimininosos armados que desembarcaram de um Fiat Pulse branco e atiraram pelo menos 33 vezes com armas calibres 9mm. O ataque durou menos de 30 segundos. Marcos de Andrade Corsato, de 62 anos, e Perseu Ribeiro Almeida, de 33, morreram ainda no local. Diego Ralf de Souza Bomfim, de 35, foi socorrido, mas não resistiu. Daniel Sonnewend Proença, mais um médico que estava com o grupo, foi ferido e conseguiu sobreviver.

    O crime, cometido num ponto turístico do Rio, gerou uma onda de comoção por todo o país. O presidente Lula afirmou, pelas redes sociais, que recebeu a informação sobre o crime “com grande tristeza e indignação” e determinou que a Polícia Federal acompanhe a investigação. Pelo fato de uma das vítimas, Diego Bomfim, ser irmão da deputada federal Sâmia Bomfim (PSOL-SP), inicialmente a polícia cogitou a hipótese de crime político. No entanto, ao longo do dia, a principal linha de investigação passou a apontar para conexão entre o crime e uma guerra entre milicianos e traficantes pelo controle de favelas na Zona Oeste: segundo a investigação da Delegacia de Homicídios (DH), os médicos teriam sido mortos por engano, já que um deles teria sido confundido com um chefe da milícia de Rio das Pedras.

    Uma câmera de segurança do quiosque que flagrou a ação foi a primeira prova coletada pela polícia: as imagens mostram que os três criminosos usaram pistolas e não se preocuparam em esconder o rosto durante o ataque. Após fazerem os primeiros disparos, eles ainda retornam e atiram mais vezes. Cada um dos médicos foi atingido por pelo menos cinco tiros. O modus operandi dos atiradores chamou a atenção dos investigadores, já que é diferente do empregado em outras execuções recentes que aconteceram no Rio. Nos assassinatos da vereadora Marielle Franco e do bicheiro Fernando Iggnácio, por exemplo, as vítimas foram monitoradas por meses e os assassinos planejaram cada detalhe da execução para prejudicar a investigação. No caso dos médicos, os criminosos sequer se preocuparam em esconder o rosto de testemunhas — o que indica, segundo os investigadores, que o crime foi cometido às pressas, sem planejamento.

    Infográfico — Foto: Editoria de Arte
    Infográfico — Foto: Editoria de Arte

    A ligação entre o crime e a guerra entre traficantes e milicianos na Zona Oeste entrou no radar da polícia após a análise de uma comunicação entre traficantes interceptada pouco antes do ataque. “Acho que é Posto 2”, disse um homem que, segundo os investigadores, faz parte da quadrilha que domina a Gardênia Azul. Apesar de o quiosque onde os médicos estavam ficar entre os postos 3 e 4, a polícia acredita que o criminoso tentava comunicar a um comparsa a localização do miliciano Taillon de Alcântara Pereira Barbosa, de 26 anos, filho de Dalmir Pereira Barbosa, chefe do grupo paramilitar de Rio das Pedras. A polícia já sabe que Taillon não estava na praia durante a madrugada, mas seus desafetos o teriam confundido com o ortopedista Perseu Ribeiro de Almeida. De acordo com as polícias Civil e Federal, Perseu tem peso, altura, cabelo e barba parecidos com Taillon.

    Taillon teve a prisão preventiva decretada pelo crime de organização criminosa em 2020, mas obteve livramento condicional há dez dias e saiu da cadeia. O miliciano mora na mesma avenida onde os médicos foram assassinados, num apartamento a 750 metros do quiosque. Desde o ano passado, Taillon e outros integrantes da milícia de Rio das Pedras viraram desafetos da quadrilha que domina a Gardênia Azul — grupo formado por ex-milicianos que, desde o ano passado, se aliou a traficantes da maior facção do Rio, o Comando Vermelho (CV).

    O pacto entre os criminosos aconteceu em meio a um processo de fragmentação da milícia do Rio, que teve como estopim a morte de Wellington da Silva Braga, o Ecko, durante uma operação da Polícia Civil, em 2021. A queda do chefão desencadeou uma série de conflitos internos na milícia em vários bairros da Zona Oeste e na Baixada Fluminense. O CV se aproveitou da fragilidade causada pelas disputas dos rivais e passou a tentar invadir antigos domínios da milícia, como a Gardênia — o que acabou levando parte dos milicianos locais a se aliarem à facção.

    Após o racha, os criminosos da Gardênia entraram em guerra com o grupo paramilitar que domina Rio das Pedras. O conflito já causou várias mortes na região, como a de Leandro Siqueira de Assis, o Gargalhone, um dos ex-milicianos que se aliou ao tráfico, encontrado morto dentro de um carro em frente ao Mercado do Peixe, também na Barra da Tijuca, em maio. Outra prova que corrobora essa linha de investigação é o destino do carro usado no crime: o veículo foi rastreado e teve como destino a Cidade de Deus, favela de Jacarepaguá dominada pelo CV — facção aliada aos suspeitos dos homicídios.

    A polícia também apura se, após a repercussão do crime, chefes do CV determinaram que os atiradores fossem mortos no tribunal paralelo do crime. As execuções teriam acontecido dentro do Complexo da Penha, na Zona Norte, apontado como o QG da facção.

    No início da tarde de ontem, a cúpula da Polícia Civil fez um pronunciamento sobre o caso. Sem responder a questionamentos de jornalistas, o secretário José Renato Torres se limitou a dizer que o crime “não ficará impune”. Já o ministro da Justiça Flávio Dino afirmou que existem “duas ou três” linhas de investigação policial sobre o assassinato. Já o secretário-executivo do ministério, Ricardo Cappelli não quis comentar sobre o rumo das investigações.

    — Temos que ter prudência — disse.

    Fonte: EXTRA

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