Armas apreendidas por policiais após ação em Itaguaí, na Região Metropolitana do Rio, que terminou na morte de 12 milicianos — Foto: Luiza Moraes / Agência O Globo
Dois sargentos da Polícia Militar são acusados de escoltar um comboio de milicianos do maior grupo paramilitar do estado do Rio, hoje chefiado por Luís Antônio da Silva Braga, o Zinho. O fato, apurado em um inquérito policial militar, ocorreu em outubro de 2020, quando Wellington da Silva Braga, o Ecko, ainda estava vivo. Na ocasião, agentes da corporação utilizaram uma viatura da PM pela BR-101, na altura de Itaguaí. Ambos foram submetidos ao Processo Administrativo Disciplinar (PAD), que está em andamento. Outros três sargentos também são citados na investigação, mas contra eles não foram encontrados indícios de infrações até o momento. Na última semana, uma operação da Polícia Federal afastou das funções públicas quatro policiais civis. Imagens obtidas pela Polícia Federal mostram, em ação semelhante, agentes ao também escoltando um caminhão pertencente a traficantes.
As investigações contra os policiais militares começaram ainda em 2020, a partir de um inquérito que apurava a morte de 12 criminosos durante um confronto com a polícia. Informações compartilhadas pela Polícia Rodoviária Federal (PRF) davam conta de que um comboio com os criminosos havia sido escoltado por uma viatura da Polícia Militar. A PRF, com base em registros de suas câmeras, também alegou ter havido um episódio semelhante 10 dias antes. O caso é alvo de um processo que tramita na Vara Criminal da Comarca de Itaguaí.
O comboio de milicianos, segundo a Polícia Civil informou à época, era comandado por Carlos Eduardo Benevides Gomes, o Cabo Benê. Ele respondia a Danilo Dias Lima, o Tandera, até então braço direito de Ecko.
O grupo paramilitar já era monitorado havia 15 dias pela Coordenadoria de Recursos Especiais (CORE), que apurou uma frequente movimentação de criminosos em uma rota que liga a Zona Oeste à Baixada.
Assim como apontavam as informações de inteligência da polícia, naquela noite, os criminosos chegaram a pegar uma via auxiliar, paralela à Rio-Santos. Esse caminho teria sido escolhido para fugir de uma blitz da PRF, realizada em frente a um posto da corporação, pouco adiante.
— Antes de chegar à PRF, existe um desvio. Para não passar em frente ao posto, eles desviavam por essa via secundária. Chegamos a montar quatro ou cinco operações dessas, mas só hoje (15 de outubro de 2020) aconteceu. Na hora em que eles pegaram a bifurcação, nós fechamos a via secundária, e eles ficaram encurralados — relatou à época o delegado Rodrigo Oliveira, então subsecretário de Planejamento e Integração Operacional da Polícia Civil.
O que consta contra os agentes
Segundo a investigação, naquele dia, os sargentos Anderson Alexandre dos Santos — lotado no 9º BPM (Honório Gurgel) — e Renan Suzart Passos — lotado no Batalhão de Policiamento em Vias Expressas (BPVE) — estavam escalados para patrulhamento do Batalhão de Polícia Rodoviária, em Piranema, em Seropédica, na Baixada Fluminense, na rodovia RJ-099. No entanto, utilizando a viatura da corporação, os dois abandonaram o posto para o qual haviam sido designados. Santos e Passos, que estavam em uma Hilux da PM, permaneceram na BR-399, sentido ao município de Santos, em São Paulo.
Informações coletadas junto à PRF e em diligências feitas pela Polícia Militar indicam que, posteriormente, a viatura onde ambos estavam seguia logo à frente do comboio de milicianos e em alta velocidade.
Após a conclusão do inquérito, Santos e Passos foram submetidos, em março deste ano, ao Conselho de Disciplina da corporação, tiveram a revogação do porte de armas, acautelamento da identidade funcional da Polícia Militar e emissão de uma carteira provisória. Em ambos os casos, a corporação concluiu que houve transgressão disciplinar de natureza grave.
Endereços ligados aos policiais, nos municípios de Paracambi, Rio de Janeiro — na Vila da Penha, Penha, Campo Grande, Padre Miguel e Senador Vasconcelos —, Queimados e Duque de Caxias, foram alvos de mandados de busca e apreensão no fim de 2022.
Em junho deste ano, Santos foi transferido para a Diretoria de Engenharia e Arquitetura (DEA) da Polícia Militar. Até a publicação da reportagem, o EXTRA não localizou a defesa dos agentes.
Força-tarefa contra a milícia
A ação — que levou a morte dos criminosos — foi parte de uma força-tarefa da Polícia Civil, criada para combater a ação de milícias na Baixada Fluminense. Na ocasião, o grupo teve auxílio da Polícia Rodoviária Federal (PRF).
O grupo foi criado para assegurar que a eleição daquele ano fosse livre e segura, depois que dois candidatos a vereador foram assassinados na Baixada num intervalo de menos de 15 dias. Os crimes levaram a polícia a antecipar a atuação que já vinha sendo desenhada.
Quem foi Cabo Benê, um dos braços direitos de Ecko
Apontado pela polícia como o chefe da milícia em Itaguaí, na Região Metropolitana do Rio, e um dos 12 mortos na ação, Carlos Eduardo Benevides Gomes, o Cabo Benê, de 39 anos, era um dos homens mais procurados do Rio. Ex-PM do 27º BPM (Santa Cruz), o agente constava no Portal dos Procurados, que oferecia R$ 30 mil por informações que levassem até ele.
Segundo os investigadores, Benê era extremamente violento. Ele entrou na Polícia Militar em 2002 e foi expulso em 2009, após operação da Polícia Civil contra a milícia de Campo Grande.
A milícia que ele chefiava, segundo a polícia, comete homicídios e pratica extorsão contra empresários, explora o transporte alternativo e a venda de gás, e impõe a cobrança de taxas sob ameaças a moradores e comerciantes da região.
Fonte: EXTRA