A primeira promessa de climatização de 100% da frota é de 2012, mas 17% dos ônibus do Rio ainda circulam sem ar-condicionado pela cidade — Foto: Alexandre Cassiano
Candidatos a vereador e prefeito, com suas respectivas equipes, já se movimentam nos bastidores para mapear assuntos que vão pautar os debates até as eleições de outubro
Em ano eleitoral, a discussão sobre temas que afetam a população no dia a dia tende a ganhar justo destaque. Neste recém-nascido 2024, candidatos a vereador e prefeito, com suas respectivas equipes, já se movimentam nos bastidores para mapear assuntos que vão pautar os debates até as eleições de outubro. Políticos e assessores sabem que o importante é se concentrar onde o calo do eleitor aperta. Transporte e segurança pública, portanto, são prioridades, mas, no Rio, também há muito o que conversar, por exemplo, sobre mudanças climáticas (e as ondas de calor) e a crescente população em situação de rua.
Como o transporte público é fundamental para o bom funcionamento de uma cidade, boas notícias na área são sempre aguardadas. Após anos de promessa e atraso — a inauguração, prevista pela última vez para o dia 13, foi adiada pela prefeitura —, o corredor Transbrasil do BRT deve entrar em operação ainda no primeiro trimestre. Junto, também será aberto o Terminal Gentileza, que vai integrar BRT, VLT e linhas de ônibus municipais. Na contramão dessa expectativa, os coletivos convencionais tornaram-se obstáculos para a recuperação pós-pandemia. Atualmente, 11 empresas estão em recuperação judicial e outras 16 fecharam nos últimos anos.
A saída para o setor foi um acordo entre prefeitura, MP e consórcios pelo subsídio à passagem, contabilizado por quilômetros rodados. As linhas que não cumprem a quilometragem mínima exigida (80% do total) não recebem o pagamento. Desde que foi implantado, em junho de 2022, até setembro de 2023, já foram repassados R$ 742 milhões.
A questão dos ônibus
Nesta primeiro de janeiro, começou a valer o aumento do repasse do município: 43% acima do ano passado. Segundo a secretaria municipal de Transporte, o cálculo do reajuste foi feito considerando o valor dos “principais insumos”, como combustível e carroceria. Marcelino Aurélio Vieira da Silva, chefe do Departamento de Engenharia de Transportes da Escola Politécnica da UFRJ, avalia que a subvenção é necessária no atual momento.
— O transporte é consequência. A pessoa se locomove por alguma necessidade: trabalho, saúde, escola. Estamos em um momento de mudanças sobre como as pessoas fazem esse deslocamento. Acredito que a sustentabilidade do sistema é uma questão de médio a longo prazo. Também é preciso, de fato, buscar uma integração melhor e isso independe da crise econômica — explica o engenheiro.
A prefeitura e as concessionárias ainda têm muitos embates, a exemplo do pagamento, pelas empresas, de multas em aberto — há um passivo de R$ 90 milhões vencidos, de 2022, do qual as empresas recorrem administrativa ou judicialmente. Outra discussão, mais antiga, gira em torno dos 100% de universalização da frota. A promessa foi anunciada em 2012 e chega a mais um verão — que, para complicar, vem sendo assolado por ondas de calor.
Para Paulo Valente, porta-voz do Rio Ônibus, sindicato das empresas, 2023 foi o ano de consolidação da recuperação do setor após a “maior crise da história”, durante a pandemia. Ele afirma que 83% dos ônibus estão climatizados.
— Linhas antes desativadas voltaram a circular após o acordo. Sabemos que não é a situação ideal, mas com os reajustes do subsídio já estamos calculando quando vão começar os investimentos na renovação e manutenção da frota este ano — afirma Valente.
Porque alcança toda parte, o calorão é assunto obrigatório em tempo de eleições. Quem não é alcançado pelas máximas dentro de um ônibus sem ar-condicionado pode estar sofrendo em salas de aula sem sequer ventiladores — em novembro, no fim do ano letivo, alunos estudavam nessas condições com temperaturas que chegaram a 34°C.
Segundo a Secretaria Municipal de Educação, foram comprados 2.149 novos aparelhos de ar-condicionado e serão investidos R$ 35 milhões na manutenção da rede elétrica e na instalação dos equipamentos. Para a população em geral, a prefeitura lançou um plano de contingência para casos de estresse térmico, com unidades de saúde servindo como pontos de hidratação.
Segurança
Também na pauta, da política e da vida comum, a segurança pública desdobra-se em todos os níveis da federação. No âmbito da prefeitura, o Supremo Tribunal Federal (STF) já firmou o entendimento de que a Guarda Municipal integra o Sistema Único de Segurança Pública (Susp), mas não possui funções de polícia ostensiva ou investigativas: a lei federal que instituiu o Susp prevê atuação integrada com participação das guardas.
Atualmente, a força municipal tem cerca de 7 mil agentes. A possibilidade de armá-los, debate que costuma ser retomado quando se reaproxima a hora de ir às urnas, passa por aprovação na Câmara do Rio — a prefeitura se diz “pronta” para qualquer decisão.
Ex-presidente do Instituto de Segurança Pública do Rio (ISP) e professora da Fundação Getulio Vargas, Joana Monteiro observa que a segurança é uma política de Estado e que é preciso parar de associar as estratégias apenas com as polícias estaduais.
— O papel das prefeituras na área vai além da Guarda atuando em locais com mais problemas. A iluminação e a instalação de câmeras são estratégias que podem ser implementadas. É preciso ampliar o debate sobre o papel municipal — reforça.
A Secretaria de Ordem Pública ressalta que cerca de mil agentes trabalham somente no plano Verão e que “atua em apoio às forças policiais dentro de suas atribuições, com foco especial no ordenamento urbano e na coerção a delitos e crimes de menor potencial ofensivo”.
Assistência social
A questões que parecem se repetir, sem soluções definitivas à vista, somam-se àquelas que se tornaram mais urgentes. É o caso da discussão em torno da internação compulsória de usuários de drogas, pauta da saúde, mas que volta e meia esbarra na segurança. Uma decisão do Supremo Tribunal Federal proíbe a remoção e o transporte compulsório de pessoas em situação de rua. O município do Rio, hoje, recorre da liminar.
A defensora pública Cristiane Xavier, titular do Núcleo dos Direitos Humanos da Defensoria Pública, diz que não há solução simples. Ela ressalta que a internação involuntária proposta por alguns se encaixaria em poucos casos e lembra que o último censo da prefeitura aponta que há 7,8 mil pessoas em situação de rua.
— São muitos os gargalos da população em situação de rua, com um somatório de problemas complexos que nunca uma decisão ou uma política pública milagrosa vão resolver. Cerca de 10% são idosos, por exemplo, que precisam de vagas não rotativas. Ainda é preciso aprimorar a capacitação de quem presta atendimento a essas pessoas — diz Cristiane.
No fim do ano, a prefeitura do Rio anunciou o Plano de Assistência para Pessoas em Situação de Rua envolvendo as áreas da Saúde, Assistência Social e Trabalho e Renda. A intenção é oferecer amparo e oportunidades para essa parcela de cariocas, como orientação vocacional e reconexão com a família. Pelas diretrizes do programa, a internação involuntária só ocorrerá por critérios médicos de risco de morte iminente, como “em caso de intoxicação grave e ideação suicida”.
Fonte: EXTRA