Em um ano marcado por ondas de calor que quebraram recordes, o final da Conferência da ONU sobre a Convenção de Mudanças Climáticas, COP29, traz muitas discussões e dúvidas sobre o futuro da geopolítica e marca um momento decisivo para a liderança climática global.
Antecipando a vinda da COP30, que acontecerá no Brasil em 2025, a COP29, que foi comumente nomeada “COP financeira”, teve como objetivo entregar um novo acordo financeiro para o clima. Este acordo promoveria um aumento no suporte financeiro vindo de países desenvolvidos a países em desenvolvimento, para que possam exercer projetos climáticos para proteger suas populações e economias. A conferência planejava substituir o alvo de 100 bilhões de dólares por ano, estipulado pela COP21 no Acordo de Paris, que se provou insuficiente para alcançar as necessidades dos países em desenvolvimento em lutar contra a mudança climática.
No início da COP29, um grupo independente (IHLEG) expert em financiamento climático, foi dado a tarefa de apresentar opções de novas políticas para cumprir com os comprometimentos do Acordo de Paris desde a COP26, e publicou recomendações, incluindo a necessidade de aumentar o investimento climático a 1 trilhão de dólares americanos, especialmente à mercados em insurgência e países em desenvolvimento.
Infelizmente, as negociações em torno do aumento em suporte financeiro foram marcadas por divisões intensas entre os participantes. Países em desenvolvimento, incluindo o Brasil, pediram o valor de 1.3 trilhões de dólares anuais com ao menos 600 bilhões sendo de fonte pública. Em contraste, países desenvolvidos argumentaram uma proposta bem mais modesta, com contribuições vindas do setor público e privado. O acordo não rendeu discussões significativas, ao contrário, desde o início das discussões no dia 11 de novembro um número só foi dado pelos países do ‘norte global’ no penúltimo dia das discussões, criando pouco tempo para análise e deliberação. A decisão final foi entregue na manhã de domingo, em um processo problemático com mudanças de última hora que deixou nações em desenvolvimento sem opções.
A negociadora chefe do Brasil, Ana Toni, declarou “Estamos desapontados que os números vieram tão tarde e que talvez não teremos muito tempo”. E completou que se os números tivessem sido entregues mais cedo, um acordo poderia ter sido feito. Outros países como Cuba, Índia, Bolívia e Nigéria também foram críticos de como as negociações foram levadas.
A decisão final criou como objetivo a ajuda financeira de mobilizar 300 bilhões de dólares anuais para países em desenvolvimento até 2035. A ONU anunciou a decisão como “o tríplice” do financiamento antigo, e adicionou que tem o objetivo a longo prazo de aumentar este financiamento para 1.3 trilhões por ano. Este prospectos podem parecer promissores, mas vamos entender o que eles realmente significam:
O acordo de 300 bilhões de dólares anuais pretende ajudar países em desenvolvimento a mudarem suas economias, se adaptarem à crise climática e serem compensados por perdas e danos. Estudos mostram constantemente, assim como os dos experts independentes que aconselham a COP, que a necessidade anual está nos trilhões. Até mesmo o texto da COP declara que implementar as NDCs (Contribuições Determinadas Nacionalmente, ou seja, as mudanças necessárias) em países do ‘sul global’ custaria entre 5.1 e 6.8 trilhões de dólares até 2030 ou entre 455 e 584 bilhões por ano. Os requerimentos financeiros para adaptação à crise climática são estimados entre 215 e 387 bilhões de dólares por ano até 2030, sem os custos de perda ou danos. Ou seja, o contraste entre os valores necessários e a decisão da COP botam em perspectiva o quão insuficiente os fundos acordados são aos países em desenvolvimento.
Também não podemos considerar que este novo número de 300 bilhões triplicará a rede de ações e fundos para os países da COP. Sim, 300 bilhões é 3 vezes 100 bilhões, mas devemos lembrar de fatores importantes sob este valor como a inflação. O último objetivo financeiro foi criado em 2009 e o novo deverá ser entregue até 2035. Levando em conta uma inflação de em média 5%, 300 bilhões de dólares valerá 170 bilhões em termos reais.
E quanto a promessa de um aumento para 1.3 trilhões de dólares por ano? Bem, esse número é uma mera recomendação, ou melhor, idealização desse processo visto que este acordo é não vinculativo, ou seja, não será imposto aos países participantes.
Outro aspecto em pauta para a COP29 era a transição para menor consumo de combustíveis fósseis, uma iniciativa já vinda da COP28, chamada “Balanço Global” (The Global Stocktake), que reconhecia que a emissão de gases de efeito estufa deveria ser cortada em 43% até 2030 para limitar o aquecimento global a 1.5°C. Assim como em 2023 na COP28, países não conseguiram chegar em um acordo sobre o Balanço Global, o que fará as discussões serem revisitadas na COP30 no Brasil.
Enquanto os recursos necessários para o sul global seguem não sendo disponibilizados, enormes quantias continuam a ser direcionadas para os combustíveis fósseis, seja por meio de investimentos ou subsídios. Na versão inicial do texto sobre a Nova Meta Coletiva de Financiamento Climático (NCQG), números chegaram a ser apresentados, mas foram excluídos do documento final. Entre 2021 e 2022, o investimento médio anual em combustíveis fósseis foi de 958 bilhões de dólares, enquanto os subsídios para o setor alcançaram uma média de 1,1 trilhão de dólares por ano no mesmo período. Esses dados reforçam que o problema não é a escassez de recursos, mas sua distribuição desigual e injusta, com o financiamento sendo canalizado para as prioridades erradas.
Com o encerramento da COP29, os países do Sul Global permanecem dependentes das ações das nações desenvolvidas e na expectativa de transformações significativas. É crucial lembrar que, embora o financiamento climático seja destinado a algumas regiões específicas, o objetivo final é alcançar benefícios globais. Agora, resta aguardar a COP30 no Brasil, na esperança de decisões que sejam coerentes com os objetivos da ONU e que promovam justiça social, responsabilidade climática e segurança global.